terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Apenas mais uma notícia?


Nas páginas de certo jornal de nossa cidade, em um sábado chuvoso, emplaca-se a manchete: “Pai é preso pelo crime de estupro contra sua filha!”

Um acontecimento farto, ‘prato cheio’ para se engordar uma página policial, fechar a edição e fazê-la, enfim, circular. Ou como nos adverte Balzac: um motivo bem vindo para se “colorir um pedaço de papel para então se faturar o dobro.”

Um acontecimento que para alguns leitores não passa de mais uma corriqueira ‘barbaridade’ das colunas polícias de um jornal; Um acontecimento que também, para Schopenhauer, satisfaz o desejo humano de sentir prazer pela dor alheia - “é sempre um prazer saber que os outros sofrem mais do que a gente”.

Essa matéria jornalística, a qual também traz como subtítulo: “Jovem teria engravidado do pai; investigação se iniciou após a morte do bebê”, produz outros desdobramentos, afetando diferentemente a cada leitor.

Creio que a notícia transcende a especificidade ou intenção de somente informar o fato como um acontecimento em si, ou vazio de novas implicações. Trata-se, portanto, para o professor Jairo Ferreira, de uma "lógica exógena aos campos específicos, assumida, como em si, pelas instituições especificamente noticiosas”. Qualquer fato vai além das intenções de qualquer jornalista. Para o repórter produtor dessa matéria, certamente pouco convém tal implicação, afinal, para ele, está seria apenas mais uma matéria para o setor policial.

Creio também que outro acontecimento emerge de tal reportagem; algo a mais advém após a leitura realizada pela filha, ou seja, pela vítima do fato em si e agora também leitora desse produto jornalístico. À esta vítima-leitora, após fixar o olhar sobre certa notícia, sobram-lhe poucas alternativas, a não ser ao menos expressar:

“Não é verdade, não é verdade! Eu não sabia disso! E agora?

Mas, se de tudo ela sabia e tinha sentido na própria pele, o porquê do desespero?

No penúltimo parágrafo uma informação - a meu ver, sem maiores implicâncias para tal produtor da matéria, porém impactante ao extremo para essa jovem leitora-

“a situação se agrava pelo fato de o homem agressor ser HIV positivo.”

A leitora-vítima, além de ser informada “pelo jornal” que seu agressor é HIV positivo, têm o seu problema, sua intimidade exposto aos quatro ventos. Lembro-me das suas palavras após fechar o jornal: “Agora se foi! Eu vou me sumir”!

Então! Isso foi apenas mais uma notícia? Certamente para essa leitora, não!